Falar sobre o passado é uma das maiores barreiras para muitas pessoas que consideram
iniciar um processo psicanalítico. O medo de revisitar traumas e reviver sentimentos
dolorosos pode parecer esmagador. Afinal, quem gostaria de reviver experiências que
causaram sofrimento? O fato é que não é bem assim…
Como bem disse Jacques Lacan: “O passado só pode ser transformado pelo retorno à sua
verdade”. Revisitar as experiências com um olhar acolhedor é essencial para reinterpretá-
las e crescer.
Antes de psicóloga e psicanalista, sou humana. E digo isso porque a pessoa que sou hoje
também é fruto de muita análise. Isso significa que antes de me tornar terapeuta, vivi na
pele esses momentos cruciais a todos que buscam a psicanálise como ferramenta de
autoconhecimento e cura. Deixo aqui meu relato com um pouco sobre a minha experiência
pessoal, talvez ela possa inspirar você neste momento.
O que considero mais importante sobre isso é ter clareza de que, ao contrário do que pode
parecer, a análise não é sobre forçar memórias ou expor alguém ao que não está preparado
para enfrentar. Esse processo é feito de forma gradual e respeitosa, com o suporte de um
profissional capacitado (alguém que fez e faz sua própria análise, estuda muito e faz
supervisão clínica de seus atendimentos) para criar um ambiente seguro. Competência
profissional não se improvisa.
Sentir emoções como tristeza, raiva ou até mesmo confusão em relação ao passado é
esperado – e faz parte do caminho para a cura. Dirigir tais sentimentos ao próprio terapeuta
ocorre, faz parte do processo. Mas, o terapeuta tem como “pensar o sentido” de tais
sentimentos, trabalhá-los de forma que conflitos sejam dissolvidos, o paciente vá se
desenvolvendo, se desamarrando, se tornando mais independente de conteúdos que lhe
faziam mal.
E vai se aproximando do que lhe faz bem.
O papel das emoções no processo terapêutico
Muitas vezes, as pessoas acreditam que sentir emoções negativas durante a análise é um
sinal de fraqueza ou de que algo está errado. No entanto, essas emoções são, na verdade,
como sinais que nos guiam para o que precisa ser cuidado. A terapia não se limita a reviver
traumas; ela ajuda a reorganizá-los, ressignificá-los e, aos poucos, transformá-los em algo
menos devastador.
Sentir raiva, por exemplo, em relação a figuras importantes do passado, como os pais, pode
ser um grande tabu. Essas emoções podem gerar resistência e até culpa. No entanto, amor
e ódio andam juntos. Às vezes, as pessoas pelas quais nos sentimos mais agredidos são as
pessoas que mais amamos. Esses sentimentos podem coexistir e, ao serem trabalhados,
permitir que o amor verdadeiro – livre de mágoas ou ressentimentos – se manifeste.
Confrontando a resistência ao passado
Muitas pessoas resistem a confrontar verdades difíceis sobre suas experiências passadas.
Esse movimento é compreensível, mas, ao evitar essas questões, acabamos promovendo,
provocando-nos vários contextos de nossas vidas, sofrimentos dos quais poderíamos nos
libertar. E impedindo que experiências prazerosas sejam vivenciadas, que possamos nos
expandir como seres humanos.
Um convite ao autoconhecimento
Revisitar o passado não é fácil, mas é um ato de coragem e cuidado consigo mesmo. Na
análise, não há pressa nem julgamento, apenas um espaço para explorar, sentir e
transformar. Se você sente medo ou resistência, lembre-se: o primeiro passo pode parecer
assustador, mas os resultados são poderosos.